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A MOÇA QUE PASSAVA

14 de julho de 2018

Imagem meramente ilustrativa

                                            

Só a reconheci porque mirei bem de perto. De longe ela jamais me lembraria alguma coisa do passado. Era ela mesma, a linda menina  que nos meus ontens passava ao largo em busca da missa, espalhando beleza e despertando suspiros nos peitos apaixonados da adolescência em flor.Quando ela passava, qualquer conversa, por mais importante que fosse, ficava em segundo plano, porque a prioridade eram os seus encantos. Não teve um jovem daquele tempo que não sonhou tê-la em seus braços, fazendo juras de amor eterno. Mas era para ver com os olhos e lamber com a testa. A moça que passava não ligava para aqueles moços de esquina, sem futuro, sem eira nem beira. Ela seria de alguém mais especial, um partido cheio de nota e de bossa, preferencialmente vindo de outras plagas, com sotaque ainda por cima.

Houve uma seca violenta naquele interior e para as obras de emergência baixou na terra um engenheiro. O homem já era passado nos anos, usava chapa e ostentava uma barriga proeminente, que não lhe permitia divisar as partes inferiores. Mas era um engenheiro com o título de diretor da firma. O pai da moça cresceu o olho grande, a própria encheu-se de desejos, o engenheiro, como era de se esperar, não desgrudou os olhos dela e dali para o namoro não demorou muito tempo. Namoraram e noivaram, depois casaram no juiz, foram embora e nunca mais se ouviu falar daquela deusa de nossos sonhos pecadores.

Até que a encontrei esta semana. Só reconheci, repito, depois que olhei de perto. Olhei e tirei a vista, com medo que ela me notasse. Não queria constrangê-la, faze-la ciente de que eu estava ali perto testemunhando um quadro que preferia não ter visto.

A linda menina se transformou. Os cabelos estão brancos, a pele do rosto enrugada que dá pena. No lugar dos belos seios que lutavam para saltar do vestido e nos dar o leite do amor, restaram duas mochilas inertes, esmorecidas, decaídas, em desuso. O corpo é uma massa disforme de pelancas e estrias. Até a bunda, aquela bunda bela e saltitante, inspiradora dos pecados solitários da turma punheteira, deu lugar a um bisaco disforme. Ficou só o buraco e catinga, para ser mais explícito.

Preferi que não me visse. Escondi-me na esquina até que ela, no seu passo lento de quem não sonha mais, sumisse no outro lado da rua.

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5 Comentários

  • Reply Luiza Inacia 15 de julho de 2018 at 11:01

    Ela te viu também: um velho murcho, feio, deselegante, barrigudo, calças frouxas. Quase igual aquele rapaz feio, deselegante, sujo, fedido, por quem nunca se interessara. Pensou: Que ótimo que nossas vidas nunca se cruzaram!

    • Reply Tião Lucena 15 de julho de 2018 at 13:44

      Você só diz isso porque nunca viu o tamanho da minha graciosa

  • Reply Angela 15 de julho de 2018 at 16:39

    Por que será que os homens quando querem se afirmarem, se sentirem o último charuto cubano,
    só conseguem se referir ao “tamanho da graciosa”? O “tamanho da graciosa” não é indicativo de nada!
    Como dizem: tamanho não é documento. E nem indicativo de qualidade.
    Esse é o tipo de frase que desagrada a qualquer mulher com um mínimo de inteligência.
    É uma expressão que me faz lembrar daquelas cantadas bobocas que começavam com a
    cáśsica pergunta; “Você vem sempre aqui?” – Não, boboca só vim hoje, e não volto mais para não
    ter que encontrar idiotas feito você.

    Ah, em tempo: considere um desabafo, esse sim um desabafo de verdade.

    • Reply Tião Lucena 15 de julho de 2018 at 17:11

      Eu respondi ao desaforo de quem me agrediu gratuitamente.

  • Reply Angela 16 de julho de 2018 at 11:26

    Só que um homem educado e civilizado como você, pode dar uma resposta com outras palavras.

    Lembra daquela famosa frase (que muitos atribuem ao Che): ” Jamais perder a ternura”?

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