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As duas coisas que tiram Zé Dirceu do sério são buceta e carne de caça, diz escritor

6 de dezembro de 2025

 

“Em novembro de 2005, após as denúncias de envolvimento com o escândalo do “mensalão”, José Dirceu, ex-ministro da Casa Civil, foi cassado pela Câmara dos Deputados na noite do dia 30 de novembro.

Sempre tive fascínio por esse personagem da esquerda brasileira. O “Alain Delon das Massas”, como era conhecido na Maria Antônia. O mineiro de Passo Quatro passava o rodo geral.

– Tem duas coisas que tiram o Zé completamente do sério. Carne de caça e buceta.

Fernando Morais, amigo do petista e escrevendo um livro sobre ele, me contou outras histórias de bastidores e ainda passou o telefone do homem.

Na época, fazendo freelas para a revista “Playboy”, sonhava em entrevistar o Zé.

Eu sabia que seria muito difícil convencê-lo a conversar com uma publicação da editora Abril, a mesma da Veja, que vivia atacando o homem forte do governo Lula, mas o meu histórico familiar ajudou.

Nada como ser nepo baby de comunista.

Zé Dirceu e meu pai, Jary Cardoso, ex-dirigente da Organização Revolucionária Marxista Política Operária (Polop) e ex-vice presidente da UNE, haviam lutado contra os milicos e pelo coração da mesma mulher: Iara Iavelberg, a grande musa da luta armada.

Não preciso dizer que meu pai disputou, mas não deu nem pra saída. O Alain Dellon da Maria Antonia conquistou Iara e certamente casaria com ela se os militares não tivessem assassinado a líder marxista em Salvador, em 1971, numa arapuca armada por Cabo Anselmo, sempre ele.

Além do mais, meu pai e Fernando Morais haviam trabalhado juntos no Bondinho, o jornal patrocinado pelo grupo Pão de Açúcar, que reuniu quase todo o núcleo da revista Realidade.

Foi nessa época que meu pai apelidou Fernando Morais de Fernando B. B de babaca. O apelido pegou. Todos os jornalistas da velha guarda se referem assim ao grande repórter da sua geração. E o meu biógrafo preferido.

Fui perguntar o porquê da alcunha. “Ele tinha uma moto, uma Harley Davidson”. Como era duro ser esquerdo-macho nos anos 60.

Voltando à entrevista com Zé. Consegui o telefone com o Fernando B, liguei pro Zé, contei de quem era filho e ele ficou em silêncio por um tempo. “Jary Cardoso? Qual era o nome de guerra dele?” Respondi: “Gabriel”. “Sim, sei quem ele é. Sim, vamos conversar”.

Edson Aran, editor da Playboy, deve ter puxado a minha capivara e verificado que eu não só era filho de comunista, como neto também. Meu avô, Antonio Campos, dirigente do Partidão, era um dos braços direitos do Prestes.
Filho e neto de comunista entrevistando outro comunista? A revista achou melhor escalar um repórter da casa, para ficar de olho em mim e no Dirceu. Fernando Barros de Mello me acompanhou nos três encontros com o Zé.

O primeiro no seu escritório, no Ibirapuera. Ele estava trabalhando como “consultor”, atividade que lhe renderia mais problemas com a Justiça.

Levei um exemplar da revista. Ele estava numa mesa, junto com uma assessora.

Ele folheou e abriu o pôster. Era uma americana peituda, branquela, da linhagem Pâmela Anderson.

Ele olhou, olhou, e disse, com aquele sotaque Mazaroppi:

– O que adianta ter buceta se não tem cintuuuura?

Nunca mais esqueço a cara de bunda da assessora dele. Que, aliás, não tinha bunda, mas tinha cintuuuuura. Uma graça.

O segundo encontro foi ainda melhor. Ele estava mais relaxado. E tinha motivos para isso. Fui recebido num quarto de um hotel cinco estrelas , com o Zé pelado, enrolado numa toalha, massageado por uma loira maravilhosa.

Falamos sobre tudo. Várias revelações.

“Diogo Mainardi é o pistoleiro que o Roberto Civita contratou para assassinar a honra das pessoas”.

“O Fernando Henrique pode cobrar 85 mil reais por palestra, e eu não posso fazer consultoria?””

“No fundo, o que eu faço é isso: analiso a situação, aconselho. Se eu fizesse lobby, o presidente [Lula] saberia no outro dia. Porque, no governo, quando eu dou um telefonema, modéstia à parte, é um telefonema!”

Recentemente, em sua coluna na Folha de S. Paulo, Ruy Castro elegeu a entrevista como uma das melhores já lidas por ele.

Eu me acho.

Esse texto faz parte do livro “Vida de Gado- 30 anos Pastando no Jornalismo”. Quem quiser comprar na pré-venda ajuda o escriba na edição.”

Tom Cardoso, jornalista e escritor

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