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Domingueiras do Tião

29 de junho de 2025

GALINHA DE CAPOEIRA

O ano de 1970 começou sem chuvas e sem chuvas continuou até o seu final. Nada do que se plantou prosperou. Açudes secaram, agricultores viraram flagelados e feiras foram invadidas por gente faminta à cata de comida.

O governo federal criou as famosas frentes de emergência, a Sudene mandou abrir escritório em Princesa, um engenheiro abusado chegou na cidade com cara de poucos amigos, anunciou de logo um concurso para admissão de fiscais, apontadores e gente de escritório, eu entrei na fila juntamente com meu irmão Edmilson e ambos fomos aprovados. Viramos apontadores.

Passávamos o dia vagando pelas turmas que se formavam ao longo da estrada que ia de Manaíra a Tavares. Reuníamos os cassacos, fazíamos a chamada, os que estavam presentes recebiam o P, os faltosos ganhavam o F.

E a corrupção comia no centro.

A maioria das turmas só contava com a metade dos alistados. A outra metade ia para o bolso do feitor em conluio com o apontador ou com o fiscal.

Teve gente que ficou rica.

Há histórias de fiscais e apontadores que, finda a emergência, se tornaram empresários dos mais diversos ramos de negócio.

Eu entrei liso e saí de bolso virado. Eu, Edmilson, Bartolomeu, os que lembro agora, chegamos a ser jurados de morte por não concordar com os arranjos dos malfeitores.

E não havia necessidade de roubar. Ganhávamos bem. A Sudene nos pagava um salário gordo que dava para comprar roupa, comida e farrear. Mas havia sempre a turma dos insaciáveis.

Costumava me misturar com os cassacos e comer a comida deles. Tinha sempre uma novidade a cada refeição. Ora era um preá, muitas vezes um tatu ou um peba, pela primeira vez comi um jacu ao molho de pimenta, sem contar as histórias recheadas de exageros que eles contavam ao pé da fogueira nas noites de lua.

Havia uma turma e havia um menino que se deslumbrava com as declamações do cego Elizeu Guabiraba sobre amores perdidos. O menino se chamava Aldo Lopes.

Num desses percursos, eu e Edmilson nos perdemos na estrada de acesso a Piancó e chegamos a uma casinha, num morro. Batemos palma, fomos atendidos por duas lindas jovens que cantavam “eu te amo, meu Brasil…” Lá da cozinha da casa vinha um cheiro gostoso de galinha no fogo. Nos convidaram para almoçar. Aceitamos. Comemos a galinha com arroz do Piancó e ainda ajudamos a lavar os pratos.

 

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