opinião

MY HOMETOWN 

8 de junho de 2025

 

Por GILBERTO CARNEIRO

 

EU TINHA OITO ANOS e estava correndo com uma moeda de dez centavos na mão até o ponto do ônibus para pegar um jornal para o meu velho.

 

Eu sentava ao seu lado naquele velho trator vermelho “valmet” enquanto dirigia. Ele espanejava meu cabelo e dizia, do seu jeito: – “Filho, dê uma boa olhada em volta. Essa é sua terra natal. Nunca esqueça”.

 

Em 1989 a tensão estava alta em Jacobina, cidade que me radiquei para estudar e trabalhar na minha adolescéncia. Não havia nada que eu pudesse fazer. Tempos difíceis haviam chegado à minha cidade natal. As janelas estavam pintadas de branco na rua principal e muitas lojas vazias. Parecia que ninguém queria mais ir para lá, pois estavam fechando a Mineradora, a Morro Velho. O capataz dizia: – “empregos estão indo garotos e não voltarão mais para a cidade natal de vocês”.

 

João Pessoa é legal, o sol brilha quase o tempo todo. A sensação é de tranquilidade, palmeiras altas e os aluguéis são baixos. Mas, sabe, eu fico pensando sobre fazer meu caminho de volta. Bem, eu sou da Bahia, nascido e criado. Contudo agora estou perdido entre dois torrões. La é legal, mas depois de tanto tempo não é mais o meu lar. João Pessoa é um lar, mas sinto que não mais é meu também.

 

Tenho um vazio bem lá no fundo, e eu tentei, mas não me abandona. Não sou um homem que gosta de desistir, nunca me importei com o som de estar sozinho. Você já leu a história do sapo que sonhava em ser um rei e então tornou-se um? Bem, exceto pelos nomes e algumas outras mudanças, se você falar de mim, a história é a mesma.

 

Passados tantos anos, ontem à noite eu e minha esposa, nos deitamos na cama e conversamos sobre a possibilidade de nos mudar. Arrumar nossas malas e talvez fazer o caminho de volta ou seguir para o sul. Estou com cinquenta e seis anos e temos duas garotas e, aqui, nos últimos tempos a vida tem sido muito dura e cruel conosco. Nos tiraram quase tudo. Agora, me arrancaram o emprego de forma arbitrária,  processo administrativo extemporâneo e esquisito, após quase quarenta anos de dedicação à função e às vésperas da minha aposentadoria. Este emprego que me foi esbulhado à fórceps foi a causa da minha vinda para cá, quando fui aprovado em um concurso público do Ministério Público da Paraíba em 1991, justamente o algoz destes meus dias.

 

As vezes, quando estou muito angustiado, ouço my hometown– “minha cidade natal”, de Bruce Springsten. Acalmo.  Lembranças da minha terra natal me fazem refletir sobre quem fui, quem sou e quem serei, por força da história que, inexoravelmente, reescreverá os fatos do law fere que foi a operação Calvário.

 

Aprendi que o mundo não se importa com o seu sofrimento.  Se  sangrar no chão, o chão vai beber seu sangue e não dará a mínima para a perseguição implacável da qual é alvo.  Por esta razão, depois que li “Ainda estou aqui”, de Marcelo Rubens Paiva e vi o filme, nunca mais ninguém me verá  numa foto que não seja sorrindo. Não darei este prazer aos meus algozes, pois não importa se você é um bom profissional, inteligente e dedicado, o que é preciso é ser forte. Não sei se sou forte, mas tento encarar a vida de frente, com base em algumas vertentes: minha fé que alimento todos os dias; minha família, alguns poucos amigos do coração, e confiança na  justiça.

 

Ontem à noite sentei ao volante e dei uma volta pela cidade com minhas duas filhas, e lhes disse: – “dêem uma boa olhada, pois esta é a cidade natal de vocês; talvez, tenhamos de deixá-la para trás.

 

Eu vi lágrimas nos olhos delas e logo tratei de fazê-las sorrir quando disseram: – “Daddy, this is our hometown!”.

 

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1 Comentário

  • Reply Paulo Fernando Menezes Almeida 9 de junho de 2025 at 11:14

    Lamentável! Porém nunca perca a esperança, “Deus jamais abandonará um filho seu”. Amanhã será um novo dia, seu conterrâneo Caetano Veloso, sempre nos acalenta cantando, e nos dando o direito de sonhar, apesar de alguns não quererem.

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