1 – A Feira da Torre era menos suntuosa, porém a sua acolhida a fazia grande. Só existiam duas lanchonetes naquele imenso mercado: a de Seu Zé e a de Dó. Seu Zé, mais famoso, reunia a fina flor da sociedade, que ia até lá curar a ressaca. Dó ficava com a rafaméia, que por ser mais popular era mais numerosa.
2 – Cansei de ver donzelas bem vestidas e de unhas feitas, vestindo longos vestidos, chegarem por lá para tirar o sono da noite comendo cuscuz com bode, com rabada e com carne guisada. E ajudavam na descida com cerveja gelada, porque ninguém é de ferro.
3 – Vi aquele famoso advogado, trazido de Camboinha após 24 horas de incessantes tertúlias, tomar várias saideiras de Rainha para tirar a ressaca. Bebia uma, pedia outra, engolia e mandava encher de novo, sempre falando alto, em tom de discurso.
4 – Também assisti ao quase duelo entre o agiota e o policial penal, o primeiro chamando o segundo de velhaco e o velhaco chamando o cobrador de corno. Quando a discussão esquentou, o policial puxou do revólver e atirou no chão de cimento. Teve um rapaz que, cagado, passou a mão na bunda, cheirou e perguntou ao dono da barraca: “Dó, sangue fede?”
5 – Aumentaram o mercado, fizeram a Praça da Alimentação, Seu Zé morreu, a dedicada esposa seguiu com ele, mudaram o local da barraca, Dó teve sorte, ficou no centro da praça, os herdeiros de Seu Zé foram levados para um beco secundário, ainda fui lá, não gostei do que vi, não fui mais.
6 – Veio o tempo de Paulo Mariano, freguês do Elias e da simpática esposa, todos gostavam do tempero de Elias, era o melhor que havia, mas Elias cansou, fechou aos sábados, repetiu aos domingos, parece que não abre mais.
7 – Paulo Mariano chegava com o cantar do galo, chamava os bêbados do mercado, a cada um dava uma tarefa: “Você compra a batata, você a galinha, você as verduras, tome tanto pra um, tanto pro outro, cuidado pra não roubar meu dinheiro”. Ninguém roubava, as compras eram feitas e trazidas com a maior eficiência. Enquanto isso Paulo bebia cachaça tirando gosto com bode e cuscuz. E tirava lera com as mulheres que serviam as mesas, soltando galanteios e sendo chamado de enxerido.
8 – Eu ia me encontrar com Paulo, todo mundo ia, Tadeu Florencio, Marçal de Batista, Bibiu Lucena, Damião de Zé de Quinca, Luciano Arroz, a turma da Torre em peso, Paulo se fizera popular, os bêbados o adoravam, era o seu líder maior, o homem que não fazia distinção e lhes confiava missões importantes junto as tarimbas do mercado.
9 – Paulo teve um troço no pulmão, foi levado ao Hospital, ficou na UTI, ainda o visitei, estava sem fala, respirando com a ajuda de um aparelho. Mesmo assim ainda deu uma dedada no delicado enfermeiro que ajeitava o tubo de respiração.
10 – Na noite pós visita, comadre Terezinha se despediu do marido prometendo voltar no dia seguinte, Paulo ficou vendo o jogo do Botafogo com o Vasco pela TV, perto das 22 horas perdeu a respiração e se foi. O enterramos no dia seguinte no cemitério do Zé Américo.
11 – E agora lá se vão meus abraços sabadais para Fred Coutinho, Márcio Murilo da Cunha Ramos, Joás de Brito Filho, Zeca Ricardo Porto, Aluizio Bezerra, João Benedito, Saulo Benevides, Marcos Cavalcante, Martinho Lisboa, João Machado, Ruy Eloi, Ana Clara de Jesus Maroja Nóbrega, Solon Benevides, Silvio Porto Filho, Yure Simpsom, Nadja Palitot e Abraão Beltrão.
12 – Houve um acidente automobilístico em Cajazeiras e apenas um sobrevivente chegou a ser levado ao Hospital Distrital com o crânio totalmente fraturado. Os médicos fizeram o possível para salvá-lo, mas seu estado era fatal.
Batista Corró, vereador e porteiro do hospital, procurou consolar os familiares da vítima:
- É isso mermo,ele morreu, mas morreu amiorado.




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