Ulisses Barbosa – jornalista
“Que loucura, como você é burro”.
Essa frase proferida por Caetano Veloso fala muito sobre os últimos 10 anos, mesmo que em um contexto completamente diferente do atual, em uma época em que o debate era entre inteligências. Explico, Caetano fez essa afirmação no programa “Vox Populi” da TV CULTURA apresentado pelo jornalista e intelectual Geraldo Mayrink (in memoria) que, de fato, estava longe de ser “burro”. Ele apenas fez uma colocação dúbia que mereceu a resposta a altura do cantor. Anos mais tarde a frase virou um “meme” que hoje serve para identificar uma parcela significativa da sociedade brasileira.
Naquela época, 1978, artistas, intelectuais e a sociedade civil organizada reagia em todos os espaços possíveis contra o autoritarismo. O conhecimento, a leitura, o estudo eram armas contra a opressão, a violência e o reacionarismo. Vale ressaltar que essa resistência começou logo no primeiro ano da ditadura com o “FEBEAPA” (Festival de Besteiras que Assola o País) de Stanislaw Ponte Preta, pseudônimo do jornalista Sérgio Porto. Claro, essa resistência, sempre que possível, se valia dos pseudônimos e outras artimanhas criativas para não se exporem à perseguição dos militares. Afinal, corriam risco real de prisão, tortura e desaparecimento (morte).
A arte, a cultura e a música exigiram uma criatividade tão intensa que os artistas desenvolveram temas ou expressões conceituais para driblar o terror da censura e claro, salvaguardar aqueles que mantinham a chama da resistência acesa. Portanto, de 1964 até 1985, a contestação, a vanguarda e a transgressão se impuseram com nomes como; Cildo Meireles (inserções em Circuitos Ideológicos); Rubens Gerchman (obra urbana LUTE); Zuzu Angel ; Dilma Rousseff, Eunice Paiva e o genial Hélio Oiticica (Tropicalia), também abraçada por Caetano, Gil, Torquato Neto, Gal Costa, Jorge Mautner, Tom Zé entre tantos outros que com coragem garantiram o enfrentamento aos generais de plantão , complementando a luta armada e a ação de políticos fortemente comprometidos com a democracia e as liberdades. Não podemos esquecer de teatro de Zé Celso e o cinema de Glauber Rocha nesse processo
Veio a redemocratização e com ela a esperança de um Brasil soberano e pujante economicamente com a diversidade cultural mais rica do planeta. E o principal, todo aquele movimento e as lutas seriam eternizados enterrando de vez a “tradição” golpista em nosso país, iniciada já na proclamação da República. Bom, não foi bem assim. Apesar de tanto sangue derramado, gentes desaparecidas, gentes torturadas, o golpismo novamente de apresentou em pleno século XXI, mais precisamente em 2016, agora travestido de “legalidade” com a participação do Congresso, do Judiciário e da mídia hegemônica. E deu muito ruim! Ruim demais, ali abriram-se as portas de um “inferno” que jamais poderíamos imaginar. Ali começou o que alguns doutores em sociologia, filosofia, antropologia, psicologia e psiquiatria denominaram de “caos cognitivo”.
2018 foi um ano disruptivo com o que há de pior no ser humano. Em meio a pós -verdade e com um impulsionamento brutal das redes sociais foi alçado à condição de presidente da República um psicopata completamente incapaz de formular um pensamento inteligível ou racional. O mundo pensante foi surpreendido da pior forma possível. Não soubemos reagir. Nos perdemos em uma onda de ódio, violência e delírios impensáveis. Algo que a ficção apocalíptica apontava mas que jamais, na nossa cabeça arejada, seria possível ser concretizada. E foi. De saída fulminando mais de 700 mil pessoas em pandemia extremamente dolorosa para nossa sanidade mental. Depois vieram os retrocessos sociais, econômicos e humanos. Tudo que conhecíamos como civilidade deu lugar à barbárie. E aí se insere o caos cognitivo.
Nomes com Nikolas Ferreira, Carolina Di Toni, Marcel Van Hattem, Zé Trovão, Silas Malafaia, Delegado Caveira, Sostenes, Marco Feliciano, Magno Malta, MBL e uma catrevagem de semelhantes dominaram a “narrativa” (argh!) em um desfile de horrores fundamentalistas anti ciência, anti conhecimento, anti direitos humanos, anti professores, anti universidades e anti trabalhadores vistos somente na Alemanha nazista e na Itália fascista. Essa “tropa” zurrou dia é noite no Parlamento, nos jornais e telejornais, mas principalmente, nas redes sociais todo tipo de inverdades, delírios e violências. Mesmo abatido, inicialmente, o povo pensante reagiu e conseguimos barrar o psicopata. Vencemos a eleição apeando do poder o criminoso contumaz. Mal respiramos aliviados, veio a tentativa de mais golpe que culminou com o 8 de janeiro de 23. Falharam fragorosamente! Condenado o líder e o núcleo central, acreditamos que íamos retornar o controle de nossa democracia. Ainda não.
O golpe continuado seguiu no pior Congresso de nossa história. Certos de como seu líder eram “imparáveis, imbrochaveis e intocáveis” urdiram as PECs da anistia e da blindagem. E aí, voltamos ao início do texto e a importância da cultura e das arte de mãos dadas com a sociedade para dizer não aos “malucos” . O povo foi para as ruas em uma manifestação gigantesca, pacífica, alegre e cheia de inteligências afetivas e emocionais, além de formais. Cantamos os hinos de lutas, nos demos as mãos e gritamos NÃO ao neo fascismo da extrema direita. Terminou? Não. Eles ainda estão aqui em cargos e com espaços que merecem. O que nos coloca como imperativo derrotá-los em 2026. Até lá nos cabe o enfrentamento onde antes eles se julgavam dominantes.
O inegável é o fato de que só não conseguiram dar o golpe de Estado porque são extremamente burros! O me lembra porque escolhi o título desse artigo, a necessidade suprema de gritar para nossos vizinhos, colegas de trabalho, as tais “gentes de bem cristã” dos templos, os políticos alinhados em nossas cidade e a mídia oligarca, o seguinte; “QUE LOUCURA! COMO VOCÊS SÃO BURROS!!!
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