Cidade

A solidão de Gilvanzinho

4 de fevereiro de 2020

Gilvanzinho estava inconformado. Aliás, seu inconformismo é uma constante, faça chuva ou faça sol. Mas nesta segunda-feira ele se lamentava mais do que das outras vezes e por isso achava que podia pedir o real do café com mais força, na certeza de ser atendido por solidariedade.

O riso de sempre dava lugar à cara de choro de quem se sente no mato sem cachorro. E não era nem preciso perguntar para ele sair contando suas desditas ao largo do antigo Ponto de Cem Réis.

Fora despejado pela viúva que arranjou no Rangel.

A viúva o botou no olho da rua, sem lenço e sem documento, com uma mão na frente e outra atrás e, pior, sem direito à volta.

Não que ele quisesse voltar. Pelo menos não demonstrava. Dizia que não teve pique para agüentar o rojão.

E que rojão!

A viúva queria sexo dia sim, dia não, mesmo estando passada nos entas e ter até bisnetos. Gilvanzinho, safado, dava o sexo em troca da boa dormida, da comida farta, da roupa lavada e da televisão colorida instalada na sala de visitas para ele assistir os beijos de Debora Seco, sua fada e musa.

-Foi só eu passar duas semanas dormindo zero a zero para ela ameaçar -, contou ele ontem na roda do cafezinho formada por Antonio Malvino, Cristiano Machado, Edmilson Lucena e o locutor que vos fala.

E sem esperar que alguém perguntasse pelas ameaças, completou:

-Ela disse que o vigia da Cagepa já andava de olho gordo e chegou a lhe oferecer cem contos. Aí eu disse: por cem pode deixar que eu dou”.

Não deu, nem ficou. Foi mandado embora, levando consigo muitas queixas. A mais profunda delas dava conta do sacrifício extremo que fazia para agradar a viúva:

-Olhe, Tião, na hora h eu botava xampu porque ela não fabricava mais óleo!”

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