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Domingueiras do Tião

4 de setembro de 2022

O CARTÃO DE CRÉDITO

O ano foi o de 91, por aí assim. O fato se deu da seguinte forma: um político de oposição, sem mandato e carpindo uma derrota recente, procurou o paraibano Lafaiete Coutinho Torres, então presidente do Banco do Brasil, para pedir um cartão de crédito. Tinha, como principal credencial, o título de presidente de um pequeno partido, coisa que foi insuficiente para sensibilizar o banqueiro oficial, que, depois de dias e dias de enrolação, terminou informando ao pretendente que não poderia lhe dar o tal cartão, por motivos políticos.

O político que não mereceu ao menos o crédito a um cartão (coisa que hoje é oferecido a qualquer Zé Povinho a troco de banana) chamava-se e ainda chama-se Luiz Inácio Lula da Silva, mais tarde eleito e reeleito presidente do Brasil e agora com a faca e o queijo para voltar ao posto nas eleições de outubro. Quem deu a ordem para que o cartão fosse negado foi o então presidente Fernando Collor de Melo, mais tarde banido da Presidência e agora protagonizando a maior ridicularia como candidato a governador de Alagoas como representante do bolsonarismo.

Este fato foi contado pelo próprio Lula, durante entrevista à repórter Clarice Brandão, da Gazeta Mercantil, direto de Santiago.

O velho adágio popular que diz: “nada como um dia atrás do outro, com uma noite no meio”, se encaixa com perfeição ao caso contado aqui. Lula da Silva terminou dono o dono do Banco que lhe negou um cartão. Teve e pode ter de novo o poder de nomear o seu presidente, de distribuir quantos cartões quiser, de emprestar dinheiro a fundo perdido. Lafaiete, o raia miúda que esnobou o operário de dedo cortado e de crédito negado, vive anonimamente no Estado de São Paulo, enquanto Collor de Melo, o ex-caçador de marajás, prepara os panos de bunda para aposentar-se melancolicamente da política e, dizem, está quase falido.

Este texto já estava publicado quando Lafaiete Coutinho tomou conhecimento dele através de Marcos Pires. E foi através de Marcos Pires que ele enviou a sua versão dos fatos:

“Prezado amigo Marcos Pires O seu amigo Tiao Lucena relata em sua coluna de hoje um episódio verdadeiro na sua divulgação mas mentiroso em sua existência. Enquanto presidente do Banco do Brasil JAMAIS o ex- presidente Lula me procurou para pedir um cartão de crédito para ele. Não me parece crível que ao presidente de um dos maiores Bancos do mundo caiba ao seu presidente deferir operação dessa natureza. Na verdade o ex-presidente queria a emissão de um cartão de crédito visa pt Banco do Brasil o que achei inadequado e impróprio para um banco oficial. Passados 30 anos do meu afastamento do Banco nenhum dos meus sucessores viabilizou o tal esdrúxulo cartão de crédito mesmo quando ele foi “ dono” do Banco do Brasil. Ficaria grato se o amigo encaminhasse esse esclarecimento. Quando da divulgação do fato a Gazeta Mercantil que tinha  publicado a matéria na primeira página publicou a minha resposta na carta aos leitores. Espero com ele ter melhor sorte.”

 

VINTE E NOVE, TRINTA

A Juarez Távora, da Torre, não era aquele inferno de carros subindo e descendo em que se transformou de noventa para cá. Tinha seus movimentos, mas eram movimentos inocentes. O ônibus dirigido por Ouro Pinto subia para o Expedicionários e ele mesmo voltava algum tempo depois, fazendo o percurso de retorno ao Mercado Central, onde ficava o terminal rodoviário urbano. No meio da Avenida havia o restaurante Braseiro Continental, especializado em galeto na brasa. Fui muitas vezes ali para jantar com dona Cacilda, nos tempos de trocados curtos e de viagens de coletivos.

Tinha o cinema Metrópole, na confluência com a Bento da Gama, para onde acorriam os jovens nas tardes de domingo para as matinês e os namoros.

Mas o que era bom mesmo ficava na Aragão e Melo, que mais tarde tornou-se meu endereço por tempos demorados. Ali a programação começava com uma meiota de Engenho do Meio, tendo moela de galinha como tira-gosto, na barraca do Zeca, até que o Bandeirantes da Torre, que funcionava no mesmo local, abrisse as suas portas para a roda de samba no pé e a chumbregação com as cabrochas da torrelândia, tidas e havidas como as mais quentes da cidade.

O Bandeirantes disputava as preferências com a Malandros do Morro, localizada no mesmo bairro, pras bandas da Beira-Rio. A Malandros era uma escola de samba acostumada a ganhar títulos carnavalescos e, nos tempos sem momo, abria seu salão para as danças de fim de semana, ao mesmo tempo em que servia de abrigo às piniqueiras que afloravam nos seus limites como andorinhas atraídas pelas torres de igrejas.

Naquele tempo eu era metido a bonito. Tinha os cabelos longos, usava barba comprida, andava sempre vestindo calça boca de sino e calçando sapato Cavalo de Aço. Era a moda da época.

Tinha chegado recentemente de Princesa, onde aprendera a namorar todas as moças do lugar e as que chegavam em visita, de modo que, naquela sexta-feira, me preparei para tirar o atraso, já que fazia dias que não conhecia o que era encostar num entrepernas de mulher.

Entrei no Bandeirantes, depois dos preparativos na barraca do Zeca, esperei que o salão ficasse cheio e, quando a festa estava animada,  chamei a primeira para uma boa dança. Levei um corte. Chamei a segunda, a terceira, a quarta e já estava perto da décima, quando desisti. Frustrado, voltei para a barraca e meti a cara na Engenho do Meio. Lá para as tantas, porém, vi uma bela morena me espiando lá de longe. Certifiquei-me que era para mim mesmo que ela olhava e, diante da certeza, fui lá, convidei-a para uma dança, ela aceitou e ficamos a noite inteira dançando e namorando, namorando e bebendo, bebendo e dançando. Até que, pertinho da madrugada, o guerreiro, que era eu, pegou no sono. Adormeci no seu colo, feliz da vida, realizado na maior das emoções.

O dia já ia amanhecendo quando minha amada, tocando carinhosamente no meu ombro, acordou-me, chamando para ir embora . A orquestra nem estava tocando mais. Levantei-me, pus o braço no seu pescoço e saímos pela Aragão e Melo, desfilando.Só que notei um negócio meio estranho. Minha companheira caminhava dando bundada em mim, ou seja, batia nos meus quartos com os seus quartos e, ao mesmo tempo em que batia, subia e descia como se fosse um vinte e nove, trinta.

Foi então que percebi: ela tinha uma perna curta, a bunda torta e se apoiava numa muleta de pau, que eu não percebi durante a noite por causa da Engenho do Meio com moela de galinha do Zeca da Barraca.

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