opinião

Edezel

14 de agosto de 2019

Eu gostava de Edezel.

Do seu jeito chato de abordar os outros, meio que brusco, mas que na verdade era apenas um jeito de ser.

No íntimo era uma pessoa boa e solidária.

Gostava de chegar em Princesa e encontrá-lo, já aposentado, puxando conversa em bocas de noite no banco da farmácia agora administrada pelo filho José.

Era um referencial para mim. Um jeito de avisar que Princesa,embora mudada e com novos figurantes pisando o seu chão, continuava a mesma de tempo atrás.

Era ele, seu Antonio Maia do outro lado da rua com sua farmácia que depois virou loja de variados, João França e suas miudezas na outra esquina,o bar e hotel de Dona Corina, a barraquinha de Elizeu montada ao lado da pensão de João do Guirra, o passado se fazendo presente nas figuras emblemáticas desses grandes e inesquecíveis princesenses.

Edezel era o penúltimo deles.

Antes partiram Elizeu, dona Corina, Seu Zé marido dela, Antonio Maia, João do Guirra…

Ainda resiste o imortal João França, agora meio aposentado, extraviado pras bandas do silo de Zé Pereira, mas resistindo heroicamente a inclemência do tempo e as inovações do futuro.

Edezel viveu muito. Passou dos 90 e isso no sertão é raridade. Da última vez que conversamos ele disse que estava na conta do saldo médio. Tinha todas as veias entupidas e poderia capotar a qualquer momento. Não capotou tão fácil. Mangou do coração, das armadilhas do destino e só morreu quando bem quís, quando já sentia o fastio dessa convivência terrena.

Ficaram os filhos. Ficou dona Neuzinha, a doce e dedicada Neuzinha amiga de minha Tia Jovem.

Se esta coluna miserável não me doesse tanto, juro que pegaria o carro e iria bater em Princesa nesta quinta.

Mas Edezel sabe que dor de coluna dói demais, e vai me perdoar por essa ausência.

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1 Comentário

  • Reply Manoel Clementino 15 de agosto de 2019 at 09:22

    Caro Tião!
    Tens uma forma única de saudar os mortos a quem devotas amor: pura, poética, sentimentalista, depuradora, enfim, como os mortos merecem. Não é de hoje que revelas esse invejável dom.
    Por isso, a tua ausência, motivada pela dor na coluna, nem será sentida, porque te fazes presente com essa belíssima “sinfonia” do silêncio.
    Paz e luz!

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