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Porque hoje é sábado

16 de agosto de 2025

1 – Um chuvareu desses só se viu naquela invernada de 1970 no sertão da Paraíba, em que Zé de Angélica, ao abrir a porta da casa e se deparar com a barra coberta de nuvens, o relâmpago cortando o céu e o trovão acordando os passarinhos, exclamou:

– Eita Zefa, é o mundo todo. Vai de Catolé do Rocha aos Estados Unidos.

 

2 – Chove em João Pessoa há dois dias e pelo jeito vai continuar chovendo. As ruas viraram açudes, lagoas, rios. Ruas de pobres e ruas de ricos, todas iguais, todas cheias, lotadas, galerias entupidas, o Jaguaribe transbordando e enchendo as casas do São José, a natureza cobrando alto preço pelos seus espaços invadidos, até a Barreira do Cabo Branco não aguentou, caiu, encheu a pista de escombros.

 

3 – Nesses tempos de chuva e de desabrigos, dá gosto ver o coronel Kelsen coberto com sua capa de chuva correndo para um lado e para o outro. Aquele ama o que faz, faz por amor, faz com gosto, tem prazer em fazer. E sem perder o bom humor, dando entrevistas com a maior boa vontade, respondendo perguntas inteligentes e perguntas idiotas com uma paciência de Jó.

 

4 – Nem o Parque Paraíba escapou das cheias. Virou o Lago Paraíba. Só faltaram os patinhos nadando. Mas enquanto há vida, há esperança, brevemente os patinhos chegarão, basta chover mais, encompridar o toró, São Pedro não fechar a torneira da Cagepa celestial.

 

5 – Fiquei sem sair de casa, só espiando de longe e me lembrando as invernadas da minha infância, quando levar chuva era esporte e não ameaça de drifuço. A gente corria para as biqueiras das casas e recebia a água do céu como se fosse um presente de Deus. Depois deitava nas correntezas da rua e se melava de lama na maior festa. Eita como era bom, aliás, bom não, muito ótimo demais.

 

6 – E quando o açude sangrava todo mundo corria para ver. Alguns pegavam os balaios e emboscavam os peixes que saiam na correnteza do sangradouro. Papai levava balaios cheios de piabas e corrós para mamãe tratar e fritar pra nós comer de mistura.

 

7 – Em Princesa tinha um açude, disse tinha porque não tem mais, no lugar dele surgiu uma enorme fossa que recebe as bostas da população. Era o Açude Velho, nossa prainha de todos os dias. A água da chuva enchia o açude e a população enchia suas margens para tomar banho e se divertir.

 

8 – Mataram o açude do milagre de Padre Ibiapina, que em séculos passados foi chamado às pressas para socorrer o paredão ameaçado de rompimento. Convocou a população, cada morador levava um saco de terra, jogava a terra na parede, e de saco em saco o paredão resistiu, não arrombou e está lá até hoje.

 

9 – Sem o Padre Ibiapina por perto e contando com a ajuda de prefeitos irresponsáveis, as fossas e esgotos da cidade foram desviados para as águas do açude, que ficaram da cor de bosta. No lugar do cheiro gostoso de água limpa surgiu o fedor horroroso de merda azeda. Uma vez pescaram enorme traíra e quando abriram o bucho dela, lá dentro repousava um enorme tolete.

 

10 – E agora, além de queda, coice. Estão vendendo as margens do velho Ibiapina. Quem não compra, invade. E quem invade ou compra aterra para construir casas. Até um posto de gasolina é erguido soberbo nas proximidades do sangradouro. Daqui a uns dias alguém vai dizer ao filho mais novo: “Aqui já foi um açude, não é mais”.

 

11 – E agora lá se vão meus abraços sabadais para Clilson Júnior, Eliabe Castor, Júnior Gurgel, João Vicente Machado, Germano Barbosa, Acires Machini, Ademar Nonato, Agnelo Muniz, Alexandre Moca, Toinho Fernandes, Antônio Malvino, Newton Arnaud, Bigu de Jacumã, Bivar Duda, Carlos Candeia, Carlos Feitosa,  Chola Morato, Edilson Júnior, Eduardo Videres, Harrison Targino, Hildebrando Rosas, 1berto de Almeida e Luiz Nunes Alves.

 

12 – A Paraíba recebeu, em décadas passadas, o presidente em festa. O governador fez tudo para o chefe da Nação se sentir em casa. Hotel Cinco Estrelas, mordomias mil, o presidente até namorar, namorou. Viajou pelo sertão, conheceu fazendas, por aqui se demorou cerca de três dias.

Quando do seu embarque, no Aeroporto, colocaram um tapete vermelho para ele pisar. O tapete ia do portão ao avião.

Acompanhado do governador, o presidente seguiu para a aeronave, ao som do hino nacional tocado pela banda da Prefeitura. Já no pé da escada, chamou o governador para um particular, debaixo da asa do Búfalo da FAB.

– Governador, quero que o senhor hospede, por uns 20 dias, o Coronel Cobato, pois ele sofreu um acidente de cama.

E diante do olhar espantado do governador:

– Uma  “namoradas” que ele arrumou por aqui deu uma mordida na cabeça da rola dele”.

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2 Comentários

  • Reply Augusto 16 de agosto de 2025 at 06:09

    Entendo que as chuvas foram acima da média, porém a falta de soluções vem de décadas a exemplo do Varadouro, em que nunca foi feito uma galeria pluvial para melhorar o escoamento das águas.

  • Reply Edmundo dos Santos Costa 16 de agosto de 2025 at 07:44

    DE SABENÇAS POPULARES SE COLHIA QUE SÓ DAVA DIFRUÇO A CHUVA QUE ACONTECIA ÀS TARDE DE MANHÃS DE VERÃO. CASO CHOVESSE, COMO OCORRIA NO INVERNO PEGADO, CHUVA NÃO FAZIA MAL HORA NENHUMA, SEGUNDO REAFIRMAVA MEU AVÔ PATERNO, MIGUEL COSTA.

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