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As juntas de Né de João

22 de abril de 2019

Né de João nem bem atendeu o telefone e foi logo informando, alegre:

-Esse ano véi se lasca! “

E ele nunca se engana quando o assunto é inverno. Se ele diz que os velhos vão se lascar, é porque vai ser inverno de dar água na canela, de chover trovão e relâmpago, e de milho verde invadir as ruas depois de lotar as roças.

Princesa é cidade fria sem chuva. Com inverno, gela. E quem tem junta maltratada geme mais do que mulher fogosa debaixo do lençol. É dor de lascar, mas uma dor alegre, satisfeita, dor de fartura, de deslumbramento, de comida enchendo os silos, as panelas e os buchos.

As chuvas naquela região ainda não derrubaram casa , nem mataram as pessoas como aconteceu no Rio de Janeiro. Mas em Princesa sempre foi assim. Ninguém jamais morreu porque choveu além da conta. Quando muito, atravessa-se um Macapá torando as ribanceiras e levando pés de umburana como se fossem canoas soltas ao vento.

A cantoria dos sapos, a terra mole afundando sob os pés descalços, o cheiro bom de barro molhado, o bode fogoso pinotando de alegria, o cachorro friorento com o rabo entre as pernas, as mulheres se assanhando e pegando bucho, o sorriso voltando às bocas banguelas dos matutos, as feiras cheias de gente, os açougues abarrotados de carne verde, o feijão verde cheirando no meio do mundo, a calça de gabardine tinindo de engomada, a asa branca voltando a bater asas sobre as copas das árvores, tudo isso é inverno, tudo isso é festa que Deus dá de graça ao matuto do meu chão.

Quando o trovão não ecoou no mês de dezembro, juro que tive medo da seca. Mas as juntas de Né de João doeram e com as dores delas acabou-se o sobrosso. Vamos ter fartura de novo, o mato já ficou verde outra vez, os bichos estão redondos de tanto comer capim e o sertão não vai mais chorar por causa de seca e de sol quente.

Por lá devo aparecer no fim do mês para a inauguração do Memorial de Aloysio e José Pereira. A canjica da mana nininha que me espere quentinha, enfeitada com canela moída e tendo na guarnição um café quente, forte e torrado no caco.

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2 Comentários

  • Reply Homero Filho 23 de abril de 2019 at 09:31

    Eita saudade do meu vale do Piancó!

  • Reply Rena Bezerra de São José 23 de abril de 2019 at 16:28

    Esse lugarzim eu conheço. Hoje essa plantas cresceram mais.

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