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LEMBRANÇAS

27 de novembro de 2022

Os três paus-d `arcos anunciavam o limite entre o roçado de milho e a mata. Deles em diante era só mato fechado, árvores enormes que escondiam todo tipo de bicho, desde o Tejo comedor de cobra, a onça sussuarana comedora de gente.

Ainda com o sol nascendo, papai saía com a  espingarda nas costas a procura de carne para o almoço.

Sentava-se na barraca de mato seco por ele preparada junto a cacimba de água cristalina e esperava os primeiros pássaros que ali paravam para matar a sede.

Eu testemunhava os tiros certeiros do velho Miguel Lucena nas codornizes, lambus, rolas azuis, brancas, cafofas e nas siricoras de bicos amarelos.

Retornávamos, papai e eu, carregando um bisaco cheio de bichos mortos.

Dali era só depená-los e jogá-los na panela colocada no fogão aberto num extinto formigueiro. E fazer a festa do almoço debaixo do frondoso juazeiro ao lado do qual fora construído o rancho de palha e pau a pique.

Antes do almoço havia o trabalho na roça. A limpa do mato, a plantação do milho e do feijão, as melancias já nascidas apresentando os primeiros frutos, a roça viçosa, com jeito de safra grande para dali a alguns dias.

Eu, menino, me aventurava pelas veredas da serra. Olhava a cidade lá embaixo, pequenina, com suas casas espalhadas na planície.

Até que a noite chegava e todos esperavam o sono contando lorotas e estórias ao redor da fogueira.

O retorno à casa na cidade se dava na sexta-feira. Meu pai tinha que voltar para fazer as compras da semana e atender a clientela que o procurava para tirar retratos na sua máquina lambe-lambe.

Eu não gostava da volta. A rua não tinha a graça da serra. Não tinha as onças sussuaranas, não tinha os tejos e tampouco os causos contados por Chico Rola. Também não se ouvia os acordes do cavaquinho de Zé Birrim tocando música de saudade.

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1 Comentário

  • Reply 1berto de almeida 27 de novembro de 2022 at 15:45

    Arretado! Que beleza! Confesso: fiquei babando com a narrativa! Melhor? Duvido! Impossível! Putabraço!

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