opinião

NOSSO CORRESPONDENTE DE GUERRA

13 de junho de 2021

 

RAMALHO LEITE

Nesses tempos de quarentena, nada melhor que vasculhar estantes e gavetas à procura de um bom livro. Quem busca encontra. Deparei-me com João Lelis de Luna Freire e seu inigualável A Campanha de Princesa. Os acontecimentos objeto daquele verdadeiro ensaio sobre a guerra de guerrilha estão ultrapassndo noventa anos. Reler João Lelis é sobretudo um exercício de paraibanidade e uma homenagem aos bravos que tingiram de sangue o solo sertanejo nos idos de 1930.
O levante de Princesa, território livre decretado pelo coronel e deputado José Pereira Lima, encontrou João Lelis já como redator de A União. Seu desejo de cobrir os acontecimentos beligerantes do sertão, à revelia do presidente João Pessoa, venceu a resistência de Osias Gomes, diretor do jornal. João Pessoa tomou conhecimento do proposito do moço aguerrido, através do noticiário que mandava do front. Ordenou mandar chamá-lo de volta. Sentia-se responsável pela sua vida. Mas João Lelis era “uma vondade de aço, que não conjuga o verbo retroceder”, assevera Osias. Só voltou à Capital quando tudo terminou. Tornou-se o primeiro correspondente de guerra da Parahyba.
O jovem repórter não cuida apenas de narrar os acontecimentos do cenário revolto, a exemplo da ocupação de Teixeira pelas tropas legais ou a recuperação de Imaculada, transformada em sede das milícias rebeldes. Emite conceitos sobre operações militares, analisa equívocos dos chefes de tropa e transcende a narrativa de uma simples reportagem, para registrar os costumes políticos da época, a exemplo: “Em 1930, tratando-se de política, tudo era possível no Brasil. Governos estaduais contra governo federal; este contra governos estaduais; estes ainda contra prefeitos ou chefes políticos, ou estes contra aqueles. Diziam que isto era liberdade, chamavam a isto de democracia. As eleições não representavam a vontade popular, e as fileiras do partido político a que se dizia pertencer o eleito não sabiam em quem haviam votado. As eleições eram falsas ou forçadas. A isto denominavam democracia porque o voto existia, mas não indicava a vontade do votante senão o desejo de poder, pertencente na época ao poder executivo ou ao partido dominante no jogo político.”
Em termos militares, ensina “O essencial, porém, para o êxito de uma tropa qualquer que seja o seu efetivo e qualquer o seu destino, reside na sua solida e voluntaria disciplina…Eis a própria alma da tropa”
Essa disciplina militar faltaria aos seguidores de José Pereira. “É bem verdade que às falanges do moreno caudilho não escasseavam capitães-do-mato à moda desse audacioso Luiz do Triangulo. Mas lhe faltava a congênita predestinação do chefe guerreiro, condutor inconteste de batalhadores, manobrador de efetivos. O chefe de princesa Jose Pereira Lina não possuía essa alma nem se permitiu encontra- la em outro corpo. Era civil por índole, por conveniência e por atitudes”
A primeira edição de A Campanha de Princesa saiu em 1944 quando João Lelis já havia participado da Revolução de 30, como oficial do 29 BC, e como segundo tenente na revolução paulista de 1932, passando pelos cargos de prefeito de Taperoá e Mamanguape, além de Santa Cruz do Inharé, no Rio Grande do Norte. Sua vocação política o levou à primeira Assembleia Constituinte da Paraíba, pós 1945.

 

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