opinião

O CHATO

11 de junho de 2023

 

Por GILBERTO CARNEIRO


O HAPPY HOUR
, ou simplesmente, hora feliz, acontecia em um clima descontraído. Acho bacana uma mesa de bar com amigos jogando conversa fora.  Entre um chopp e outro, conversávamos sobre os mais diversos assuntos. Mas de repente ele chegou, o chato. O cara era um conhecido de um dos meus amigos. Sem pedir licença foi se assentando e disparando sua metralhadora giratória verbal.

Logo adentrou na política e começou achincalhar o governo Lula. Não que todos à mesa fossem simpatizantes dos ideais de esquerda, ou do governo atual, mas a forma mal educada e grosseira que o intruso se envolveu na conversa fez pesar o ambiente.

Em um certo momento atacou a proposta do governo de subsidiar carros populares sob a justificativa de proteção ao meio ambiente. Até então me mantive em silêncio por falta de disposição para iniciar uma discussão, mas quando começou a destilar sua aporofobia (ódio aos pobres), interrompi e perguntei – “quantos automóveis você tem na sua garagem?” E a soberba fez cair sua máscara. – “lá em casa são quatro carros, nenhum popular, um para cada membro da família. Por quê a pergunta?”

Coube aos meus amigos explicar a contradição que havia no discurso do impertinente. Como usar o argumento de proteção ao meio ambiente para impedir que os mais pobres adquiram seu carro próprio com ajuda do governo quando se tem quatro carros de luxo na garagem?  Percebendo o deslize, irritou-se e nos deu o prazer de levantar-se e ir embora.

É sempre assim. Qualquer medida proposta pelo governo que vise beneficiar os pobres; os mais abastados, ou ao menos a maioria, ou que aparentam ser, caem de pau com seus comportamentos e falas preconceituosas. Se é o bolsa família a crítica é que o governo vicia um monte de vagabundo a não trabalhar, como se uma família receber 600 reais por mês fosse suficiente para menosprezar trabalho, valor que gastam com uma garrafa de vinho. No caso da proposta de isenção do IPI para carros de até 120 mil reais, a hipocrisia é que irá aumentar a emissão de gás carbono, o que seria uma preocupação legítima se o argumento fosse verdadeiro.

A conversa na mesa do bar me fez lembrar uma outra situação. Quando o governo Lula II fez baixar os preços das passagens aéreas seguia para Brasília e sentei na poltrona do corredor em meio a duas realidades distintas. Ao lado da janela uma senhora elegante mantinha o rosto constantemente voltado para o lado oposto da cadeira ao seu lado, que por sua vez, possuía como ocupante uma outra senhora de rosto marcado por rugas causadas pela necessidade de exposição excessiva ao sol.  No momento de servir o lanche, a senhora sentada na cadeira do meio ficou na dúvida se recebia ou não a comida. Percebendo que não tinha experiência em voo informei que o lanche era gratuito, ao menos naquela época. Ela sorriu, pegou o lanche e se desculpou dizendo que estava indo visitar sua filha e, por ser a primeira vez viajando de avião, não conseguia controlar seu nervosismo. Neste instante a madame do lado a encarou e perguntou com uma voz impregnada de preconceito. –   “então por qual motivo a senhora não viajou de ônibus?”. Ela falava olhando para mim achando que corroboraria com seu discurso xenófobo. A senhorinha lhe olhou com seu jeito simples e inocente, dizendo: – “madame, estou realizando um sonho de viajar de avião, me sinto muito feliz, embora esteja nervosa”. Naquele momento deu vontade de cantar para a madame a música “O chato” de Osvaldo Montenegro, mas antes, percebendo o quanto estava sendo inconveniente, optou por se retirar e sentar em outra poltrona.

 

Este governo possui uma responsabilidade muito grande de mudar a realidade deste país, de fazer estas pessoas entenderem que podem continuar ganhando seu dinheiro. O que se pergunta é porque se incomodam tanto quando percebem que os pobres estão se imiscuindo um pouquinho no seu meio?

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1 Comentário

  • Reply Paulo Fernando Menezes Almeida 11 de junho de 2023 at 19:32

    E a classe média é a pior que tem! Detestam governos progressistas, porque regulamentaram profissão da doméstica, tirando das “outrora madames’, o poder de tê-las com o trabalho análogo ao escravo.

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