opinião

Sobre velórios

1 de março de 2020

Marcos Pires

Esse costume de velar o morto tem duas explicações plausíveis e ambas  vem da idade média, com uma base comum; a preocupação em observar por varias horas ou até mesmo alguns dias o corpo do falecido com receio da narcolepsia, cujo resultado era enterrarem o corpo e posteriormente o pobre coitado acordar embaixo de sete palmos de terra. Essa é a mais acreditada origem do velório, porém a segunda explicação me agrada mais. Consta que um cidadão, muito contente porque a sogra morrera e além dessa alegria a defunta ainda deixara-lhe boa herança, resolveu comemorar. Chamou os amigos e enquanto esperavam decorrer o prazo da tal narcolepsia, serviu bebidas e comidas a todos. Com a noite chegando, acenderam-se velas e a partir daí os empreendedores da época transformaram aquela presepada em lucrativo negócio.

Menos importa, vale é lembrar sempre o que dizer à família no velório. De tão acostumados no dia a dia, a tendência é perguntarmos à viúva “-Como você está?”, ou, pior ainda; “- Tudo bem?”. Também é de péssimo gosto usar os termos “-Ele está num lugar melhor” ou “-Finalmente descansou”. Como assim, ao lado da família ele vivia num inferno, era?

Já vi de um tudo em velórios. Minha querida amiga C., venenosíssima, me fez uma pergunta acerca do falecimento de madame J.: “- Ô Marcos, é normal um vizinho desmaiar três vezes no mesmo velório da vizinha que morreu de Aids?”. Certa vez meu amigo N., já “animado” com umas quantas cervejas tomadas no bar do Zuca, desafiou os presentes; pagava mil reais a qualquer um que tivesse comparecido ao velório de um anão.

Cantadas em velório? Vi às dezenas, mas a pior foi a do jovem E., abordando uma gata linda:”- Ei, amor, você vem sempre aqui?”.

Mas de tudo o que conheço sobre velórios, a história que mais me impressionou foi contada por Toinho Amaral. Disse que era amigo de gêmeos, Otavio e Ovídio. Otávio morreu, mas no anuncio fúnebre trocaram os nomes e publicaram a morte de Ovídio. Otávio evidentemente compareceu ao enterro do irmão e anotou o nome de todos os amigos comuns que não foram à cerimonia fúnebre. Dali pra frente e pro resto da vida, sempre que algum desses faltosos falecia e um amigo comum o chamava para o enterro ele era enfático: “-Vou não, e sabe por que? Porque esse safado não foi ao meu velório”.

Você pode gostar também

1 Comentário

  • Reply José 1 de março de 2020 at 11:20

    Uma muito boa é “A Vontade do Falecido” de Stanislaw Ponte Preta, que conta a estória de um tio sovina e um sobrinho interesseiro. https://www.recantodasletras.com.br/humor/916195

  • Deixar uma resposta

    Esse site utiliza o Akismet para reduzir spam. Aprenda como seus dados de comentários são processados.